"Quem ele acha que é !? Um dia ainda vou vencê-lo dentro da pista."
Senna procurava ocupar um espaço que Nelson Piquet, parecia fazer questão de dispensar. Nas redações, sua chegada foi uma espécie de redenção para os jornalistas, já um pouco cansados do convívio difícil com Nelson, um campeão mundial que ganhava também sucessivos troféus Limão pela falta de paciência e a antipatia que lidava com a fama e, de modo muito especial, com a ignorância absoluta dos repórteres brasileiros em relação ao automobilismo.
Entretanto, nem somente de guerras viveram Ayrton Senna e Nelson Piquet, às vésperas do início da temporada de 1985, Renato Maurício Prado foi testemunha de um momento de cordialidade, entre ambos. Nelson, bicampeão de sete temporadas, e Ayrton, muito mais que um estreante a caminho de sua segunda temporada, tomaram suco de laranja e água mineral e comeram, respectivamente, omelete de frango e filé mignon grelhado, em um restaurante do Rio de Janeiro. O almoço era uma entrevista conjunta proposta aos dois pelo repórter, Paulo César Martins do jornal O Globo.
Renato anos depois disse em depoimento, que já podia ver sinais da feroz rivalidade entre os dois grandes pilotos brasileiros:
"Vi o Ayrton tentando muito mais ser amigo. Nelson estava diplomático, mas cético."
Senna, generoso em elogios, premiou Keke Rosberg com um comentário que muito provavelmente nunca mais fez, sobre qualquer piloto em qualquer tempo:
"- Eu não consigo fazer o que ele faz. O Keke tem um talento extraordinário"
Sobre Piquet, sentado ao lado, Ayrton foi menos criativo:
"Nem preciso dizer nada. O que eu poderia falar sobre quem foi duas vezes campeão mundial e duas vezes vice?"
O piloto italiano Elio De Angelis, que passou pela mesa no início da entrevista, soube definir com sapiência a reunião:
-"La prima e la ultima"
De certa forma, Elio, falara com total sabedoria, à partir daquela temporada Piquet e Senna, iriam tornar pelo menos dentro de pista, a rivalidade pública. Nelson juntamente com Alain Prost, criticavam publicamente Senna, por este ter um "pé pesado", segundo os dois pilotos, Senna aumentava irresponsavelmente a pressão do turbocompressor e, com isso, provocava panes secas e outros problemas no motor. Piquet chegaria, tempos depois, a responsabilizar Senna pela desmoralização completa do motor Renault na F1.
Gerard Ducarouge, na insuspeita condição de aposentado da F1, contestou com um sorriso resignado a tese do pé pesado. Na verdade, segundo ele, Ayrton ficava sempre abaixo da pressão recomendada por Bernard Dudot, o diretor da Renault. E mesmo assim, as panes secas continuavam. A explicação de Ducarouge: a Renault não tinha uma eletrônica suficientemente desenvolvida para ser mais precisa em relação ao consumo de combustível de seus poderosos motores.
Senna não sabia engolir sapos. Não admitia a insinuação de que era um espanjador de combustível e se dava até ao trabalho de recolher e guardar dados telemétricos que provavam que seus motores eram usados em regime máximo de economia. E como não tinha contrato de silêncio com a Renault, punha o dedo em riste e soltava o verbo:
"- O maior dos meus problemas, uma palavra basta: motor."
O primeiro combate em pista, no entanto, se deu em Monza (1985), Senna que havia superado Nelson Piquet no treino de classificação, larga melhor que seu compatriota e começa abrir vantagem. Entretanto Piquet, depois de se recuperar de forma brilhante da péssima largada, é empurrado para a grama por Ayrton Senna, o troco dessa vez, veio à mais de 300 km/h. Em plena reta dos boxes, Nelson Piquet, jogou sua Brabham em cima da Lotus em plena reta dos boxes. Não houve feridos e nem sequer um acidente. Entretanto, à partir daquele momento, os dois maiores pilotos da história do automobilismo brasileiro, começavam uma guerra particular.
Porém duas semanas depois, Senna venceria pela segunda vez naquela temporada, e Nelson Piquet, concordaria com o talento de seu adversário. Em uma corrida espetacular, Senna vencera de forma incoteste em Spa (Bélgica) e novamente debaixo de chuva. Piquet ao fim da corrida comentou resignado:
"Ele correu maravilhosamente. Teria vencido qualquer um, por melhor que fosse o carro."
Quando todos se preparavam para celebrar mais um show de Senna, a surpresa: Piquet cravou 1m07s482, cruzando a linha a exatos 296 quilômetros por hora. E Brands Hatch, mais uma vez, prendeu a respiração para acompanhar o contra-ataque do predador. Em plena volta voadora, no descortinar de uma lombada. Senna deu de cara com a Mclaren de Prost em volta de desaceleração. Não se permitiu o direito de levantar o pé nem por uma fração de segundo. Ultrapassou o futuro rival como uma bala. E, ao cruzar a linha, 1m07s169.
O jovem aos poucos conquistava lugar de destaque, Senna fora escolhido pela equipe da revista Placar como "O Esportista do Ano" e, naquela mesma semana do GP do Brasil, comparecera à festa, na boate Gallery, em São Paulo, para receber um prêmio que antes fora dado a Zico, Sócrates, Jorginho, Montanaro, da seleção de vôlei, e Joaquim Cruz, recordista mundial de atletismo. Piquet, mesmo tendo sido duas vezes campeão, nunca o ganhara. Na festa, Ayrton ficou sem graça em dois momentos: ao perceber que, trajando calça bege e camisa social branca, era o único sem terno, e ao levar uma bronca carinhosa do veterano Chico Landi pelas "loucuras" que fizera no circuito de Adelaide em 1985.
No treino de classificação para o GP Brasil de 1986, e na volta ao cockpit, Senna mostrou aos brasileiros, já depois de o locutor do autódromo anunciar, precipitadamente, o fim do treino oficial, o show que os europeus já tinham aprendido a apreciar em 1985: nos últimos instantes da sessão, uma volta perfeita, recorde da pista, pole position e uma explosão de delírio nas arquibancadas. As vítimas da vez: Nelson Piquet, o mais rápido até aquele momento, e Mansell, com a outra Williams, empurrado para a segunda fila no último instante. Ayrton saiu do cockpit emocionado:
"Foi maravilhoso! Viva o Brasil!”
O que o Brasil tinha a ver ou não com momentos como aquele passou a ser uma das polêmicas freqüentes na fronteira cada vez mais hostil que separou os chamados piquetistas dos sennistas. Os primeiros viam nos gestos de Ayrton uma fria e bem-fabricada estratégia de marketing.
Os fãs de Senna exaltavam aquelas atitudes como o comportamento ideal de um esportista, atento ao seu papel de ídolo e orgulhoso de seu país.
Ayrton e Mansell se tocaram no meio da velocíssima curva 1, depois de uma freada, a mais de 300 por hora. Senna conseguira se manter no traçado e Mansell escorregara pelo lado interno da curva até bater no guard-rail e lá ficar, para delírio de mais de 60 mil torcedores brasileiros.
Era outra encrenca que estava apenas começando e que terá um capítulo específico em nossa Série.
Senna e Piquet provavelmente nem saberiam explicar o significado político e ideológico daquela corrida. Mas este detalhe não fazia a mais remota diferença naqueles momentos decisivos do GP da Hungria. Nelson, mais rápido, encostara em Senna e dava todos os sinais de que pretendia passar a Lotus na freada para a longa curva no final da reta dos boxes. Mas Senna não facilitou, mantendo o carro na parte central da reta e, com isso, deixando pouco espaço para Piquet fazer a tomada da curva.
Ninguém refez os planos reta abaixo. Resultado: Piquet chegou a ficar à frente de Senna por alguns instantes antes de escapar com as quatro rodas para a parte externa da curva e ver Ayrton reassumir a ponta. Nelson não gesticulou nem ensaiou qualquer protesto. Mas estava furioso.
Duas voltas depois, o público das arquibancadas e o pessoal do paddock mal respirando, os dois brasileiros entraram novamente pela reta, a Williams de Nelson grudada na caixa de câmbio da Lotus de Ayrton. Mais uma vez, Senna não facilitou, tentando apertar Nelson para o lado de dentro. Surpreendentemente, Piquet, em vez de se lançar por dentro, optou pelo lado externo, à esquerda.
Era o trailler de um grande acidente. Nelson Piquet, ora vejam, tentando ultrapassar logo quem, Ayrton Senna, e ainda por fora. Por alguns instantes, o que Ayrton viu, a poucos metros do bico de sua Lotus, foi um carro de Fórmula 1 completamente de lado, como se fosse um kart, continuar fazendo a curva, sem escapar para a caixa de brita como ele, os chefes de equipe, os mecânicos, os comissários de pista e milhões de espectadores mundo afora esperavam.
Piquet contrariou milagrosamente todas as previsões. Saiu da curva na frente de Senna, arranjou tempo para acenar um adeus para Ayrton com a mão direita, venceu a corrida e, em vez de saborear a façanha, criticou:
-"Senna não podia ter mudado a trajetória no momento em que eu corria mais e estava preparado para passar. Fui obrigado a ir para o lado de fora da pista. Ele é assim mesmo na hora de entregar uma posição. A gente tem é de se acostumar com isso quando estiver numa disputa com ele.”
Os dois mal se cumprimentaram na cerimônia do pódio. Mais tarde, Ayrton não estava para elogios e esqueceu do próprio estilo ao criticar o rival:
- "Tive de frear muito para evitar um acidente. Foi uma manobra perigosa dele.”
O veterano jornalista Lito Cavalcanti, correspondente brasileiro da Autosport, resumiu, anos depois, o significado daquele duelo:
- "Ninguém jamais parou Senna como Piquet fez naquele dia.”
Para Jackie Stewart, a façanha de Nelson teve uma descrição aeronáutica:
- "Foi como fazer um looping com um Boeing 747.”
- "Tinha que ser algo cheio de adrenalina, mas sem ser Fórmula 1.”
Reginaldo chegou a provocar Nelson, dizendo que tinha filmado Ayrton solando no esqui e que duvidava que ele fosse capaz de fazer o mesmo. Frank Williams estava no mesmo vôo e participou da conversa. Reginaldo, cada vez mais preocupado com as brigas de Piquet e Senna dentro e fora das pistas, estava feliz:
- "Eu não queria transformar os dois em grandes amigos, mas pelo menos em colegas que se respeitassem.”
Ele não conseguiria.
A centésima... quem será o autor da centésima vitória do Brasil na F1?
ResponderExcluirGrande Polloto, seu texto é muito pertinente, no que tange a qualidade no resgate histórico do automobilismo nacional. Não creio que a corrida vá ser fácil para Jenson Button neste próximo final de semana, acho que a RBR, iŕa novamente demonstrar força e se em um circuito, onde a estratégia faz muita diferença (como Instambul), Silverstone normalmente, ela não vêem a influenciar tanto os resultados finais, embora seja importante. Logicamente que os dois grandes favoritos a vitória são: Button e Vettel. E a vitória (100°) do Brasil deve esperar mais um pouco. Por que definitivamente e mesmo apesar de toda sua experiência e qualidade, o Rubinho é o típico piloto que nasceu para ser 2° na vida, não adianta, isso é o máximo que ele consegue, até pegando emprestado uma frase de filme Hollydiano:
ResponderExcluir"Falta-lhe os olhos de tigre" (Rocky III)
Torço para que a tão sonhada vitória, venha nas mãos de Felipe Massa, que é um piloto que apesar, de não ter um bom equipamento, demonstra brio e vontade, mas a Ferrari definitivamente não irá brigar por vitórias nesse ano.
A pergunta é inegável: quem vai dar a 100ª vitória para o Brasil na F1? Esta pergunta não quer calar. Mas logo após já surge uma outra pergunta, esta muito mais preocupante do que a anterior: QUANDO virá a 100ª vitória brasileira na F1? O ano de 2009 começou promissor ao Brasil, falou-se até em título brasileiro, coisa que não ocorre há 18 anos, quando Ayrton Senna foi campeão, em 1991. Mas o que se fala agora é quando virá a vitória número 100, e por que até agora está tão difícil dela chegar. Jenson Button desbancou o favoritismo do seu companheiro Barrichello, e lidera com folga o mundial, com a incrível marca de apenas 4 pontos perdidos em 70 disputados até aqui. Para o GP da Inglaterra, mais uma vez temos que esquecer por um pouco o tema 100ª vitória. A Ferrari evoluiu, mas não ao ponto de retomar a hegemonia da F1. Pensar numa vitória de Felipe Massa no ano é algo bastante irreal. Para Barrichello o desconforto é ainda pior, pois ele sim tem em maõs o melhor equipamento do grid. Só não contava com a excelente fase de Button. E é este nome que terá, mais uma vez, que ser batido neste fim de semana. A pista de Silvertsone ajuda muito a pilotagem de Button: tem boa aderência, sem curvas complicadas e de boa média de velocidade. Num lugar em que dificilmente grandes carros quebram, é natural apostar em mais uma vitória do inglês. Liderando inquestionavelmente o campeonato, correndo em casa, com o melhor carro do momento, somente uma zebra poderia tirar mais um triunfo das maõs de Button. A mais nova pergunta que fica no ar, depois de QUANDO virá a vitória 100 do Brasil é: QUAL é o nome desta zebra?
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